Trás-os-Montes
Montanha. Terra Fria. Terra Quente.
Do alto da montanha, avistam-se as formações de granito e o xisto, entre uma vasta manta de retalhos geológica riquíssima existente nesta região situada além dos montes. Raiano, inóspito e, simultaneamente verdejante, quase misterioso, mágico, este território localizado a nordeste de Portugal ocupa uma área de 5.538 km2, constituída por nove concelhos – Alfândega da Fé, Bragança, Macedo de Cavaleiros, Miranda do Douro, Mirandela, Mogadouro, Vila Flor, Vimioso e Vinhais –, onde mais de uma vintena de produtos DOP e IGP exaltam o património gastronómico, herança secular transmitida a cada geração que passa neste “reino maravilhoso”, do escritor português Miguel Torga. É de salientar a importância da Reserva da Meseta Ibérica, a enorme reserva transfronteiriça da biosfera composta pelos parques naturais de Montesinho, do Douro Internacional, de Sanabria e das Arribas do Douro, e onde a fauna e a flora concentram uma gigantesca diversidade endémica.
A região transmontana está dividida entre Terra Fria e Terra Quente, ditadas pelas diferentes características morfológicas e climáticas.
Terra Fria do Nordeste Transmontano. Vinhais, Bragança, Miranda do Douro, Vimioso e Mogadouro. A altitude elevada e o clima frio e húmido são atributos comuns a estes cinco municípios. O todo é constituído pelas Serras da Nogueira e Montesinho e pelas Serras de Sanabria e da Culebra. O Planalto Mirandês é de excelsa beleza. Os rios receberam os nomes de Sabor, Rabaçal, Tuela e Maçãs. Os lameiros, designação atribuída aos enormes prados verdejantes, a contrastar as searas de trigo e centeio, são acompanhados pelo carvalho negral partilhados pelos soutos de castanheiros, em florestas espontâneas cravejadas de sobreiros, azinheiras, oliveiras, freixos e zimbreitos.
Enalteça-se o produto, como o Porco Bísaro, raça autóctone portuguesa, indelével na Terra Fria. Prove-se a alheira, da chouriça de carne, da chouriça doce, o chouriço azedo e o butelo de Vinhais, o Cabrito Transmontano DOP, o Queijo de Cabra Transmontano DOP, o Cordeiro Bragançano DOP, a posta mirandesa, obtida a partir da Carne Mirandesa DOP. Fale-se do congro e da truta das ribeiras de água fria, sem esquecer o barbo ou a carpa. Inclua-se a Castanha da Terra Fria DOP, disponível em dez variedades – Amarelal, Aveleira, Boa Ventura, Côta, Judia, Lamela, Longal, Martaínha, Negral e Trigueira. Acrescente-se as casulas (vagens de feijão secas) cozidas com o butelo, dupla servida com batata cozida, enchidos, presunto e azeite, bem como a marrã (carne de porco fresca assada na brasa) e os chichos (lombo de porco em surça assado na brasa), ou as sopa de chis ou tchis, que se come no dia da matança do porco e que constam no compêndio das receitas típicas de Mogadouro. Ensaia-se a feitura do cuscuz,
Terra Quente do Nordeste Transmontano. Alfândega da Fé, Macedo de Cavaleiros, Mirandela, Vila Flor e Carrazeda de Ansiães. As altitudes baixas e o clima quente e seco conferem as semelhanças, entre os vales do Rio Sabor, as serras de Bornes e dos Passos, e a agricultura mediterrânica. Falemos da cereja e da amêndoa de Alfândega da Fé e da castanha de Macedo de Cavaleiros, da azeitona de Mirandela e de Vila Flor, e da uva de Carrazeda de Ansiães. Acresce a couve penca, na freguesia de Carvalhais, no concelho de Mirandela, utilizada tradicionalmente na época natalícia, e a típica alheira de Mirandela, que terá surgido em finais do século XV. Carne e gordura de porco, carne de aves, pão de trigo, azeite e banha são alguns dos ingredientes principais de tão apreciado enchido. Junte-se o Queijo Terrincho DOP e o Borrego Terrincho DOP, ambos obtidos respectivamente do leite cru e da carne de ovelha de raça Churra da Terra Quente DOP. Adicione-se o Azeite de Trás-os-Montes DOP, produzido a partir das variedades Verdeal transmontana, Cobrançosa, Cordovil ou Madural, e o Mel da Terra Quente produzido pela espécie de abelhas Apis mellifera Ibérica. Da caça, provém o javali, a perdiz, a lebre, o coelho, o pombo-torcaz.
Toda esta imensidão de matéria-prima é pretexto maior, para explorar as frondosas florestas e descobrir os riachos, as ribeiras e os rios, pelos seus leitos banhados por águas límpidas. É um permanente desafio que convida a percorrer as serras pontilhadas de montanhas e vales, onde prevalece a vegetação endémica e a fauna preservada. É um imenso roteiro, onde entram as aldeias serranas, com o seu passado, os seus costumes e as suas tradições, as suas gentes e a sua cultura marcada pelas Festas de Inverno, com os Caretos, os ritos solsticiais e os pauliteiros de Miranda a par com os edifícios que marcam diferentes épocas de uma história que começa na era pré-romana.