“O nosso sal provém do mar, é sal marinho, mas é marinho por técnicas tradicionais, é tudo feito artesanalmente. Sai directamente da marinha para a nossa alimentação. É preciso que as pessoas saibam que ao consumir este produto estão a manter o ecossistema, a actividade e a identidade.”
Amor Com Sal Q.B.
Salina dos Doutores, Ilha da Morraceira
3090-707 Figueira da Foz
Como chegar
+351 963 152 327
Facebook: / @Amorcomsalqb
Texto de Cláudia Lima Carvalho
Fotografias de Joana Freitas
Foi só quando os avós acusaram o cansaço de uma vida que Gilda Saraiva despertou para o ofício. Até aí, as marinhas de sal eram, acima de tudo, lembranças dos muitos verões passados com os primos em brincadeiras. “Nós íamos só usufruir do espaço, da água e brincar. Aquilo era o trabalho deles, não era o nosso. Além disso, o meu avô era muito rigoroso e nem sequer podíamos meter os pés ao pé do sal”, recorda. “Eu segui o meu percurso normal na escola, fui para artes e depois para arquitectura.” A ideia, porém, de que os avós poderiam estar prestes a abandonar uma das suas duas marinhas era impossível de aceitar. “Mais uma salina abandonada quando já havia tantas? Não podia ser.”
Vinte anos depois, Gilda é, ao lado da mãe, produtora da marca Amor Com Sal Q.B., e responsável pelo Núcleo Museológico do Sal, na Figueira da Foz. “A partir do momento em que me apaixonei pelo sal, acabei por me dedicar muito mais a isto”, conta. Hoje, é a mãe, Maria de Lurdes Bertão, quem trabalha na salina, enquanto Gilda se dedica principalmente à pedagogia e à divulgação da actividade.
Com o avô, que já seguia as pisadas dos pais, Gilda aprendeu a ler marés e luas, a abrir as comportas no momento certo e a cuidar de cada compartimento da marinha, onde a água se transforma lentamente em cristais. “Ele foi o meu mestre”, afirma, orgulhosa. “Muitas vezes as pessoas pensam que é só colocar água e o sal acaba por aparecer. Não é bem assim, há um saber fazer que, mesmo eu com a minha ligação, não tinha noção. Foi uma aprendizagem”, assegura. E explica: “O nosso sal provém do mar, é sal marinho, mas é marinho por técnicas tradicionais, é tudo feito artesanalmente. Sai directamente da marinha para a nossa alimentação”.
É mais rico nutricionalmente “porque assimilou tudo que a água do mar tem”. Gilda fala de “cálcio, magnésio, iodo, potássio, microorganismos vivos”... “O nosso sal não é somente cloreto de sódio”, garante. E a influência do território é evidente: “Na Figueira da Foz, devido ao clima e aos nevoeiros, o cristal não se faz rapidamente. Não há sol, nem temperaturas suficientes”, contextualiza, mencionando também a base de argila negra e a menor salinidade da água. O resultado é “um cristal que se desfaz muito mais facilmente, é muito mais solúvel e tem um sabor muito mais suave”. “Eu costumo comparar o nosso sal a um bom queijo ou a um bom vinho que, consoante o sítio geográfico onde é produzido, tem um sabor e uma característica específica. Com o nosso produto acabamos por trazer o mar para a nossa alimentação”, aponta.
A vontade de inovar surgiu, entretanto, de forma natural. “Começámos também a explorar a flor de sal, que os meus avós não exploravam, e começámos a fazer agricultura biológica de ervas aromáticas à volta da própria marinha de sal.” Ervas, essas, que permitem criar novas combinações com o sal. “Queríamos sentir a marinha como um todo”, resume, deixando um alerta: “É preciso que as pessoas saibam que ao consumir este produto estão a manter o ecossistema, a actividade e a identidade”. “As pessoas fazem a diferença.”
O sal que Gilda e a mãe produzem encontra-se à venda nas salinas, no Mercado Municipal Engenheiro Silva e em algumas lojas da região, sendo possível também pedir o envio.